São Luís: valorização dos mestres da cultura popular pode virar lei
Em meio à riqueza cultural que permeia as manifestações populares de São Luís, um inovador projeto de lei surge com o intuito de valorizar e preservar o legado dos mestres e mestras dos saberes da cultura popular maranhense. Idealizado pelo Coletivo Nós (PT), a proposta cria o Programa de Valorização de Mestres e Mestras dos Saberes da Cultura Popular Maranhense e tem como objetivo reconhecer e apoiar os guardiões destas tradições, como o bumba-meu-boi, o tambor de crioula e o cacuriá, manifestações que são símbolos da identidade cultural do Maranhão.
O co-vereador Jhonatan Soares, do Coletivo Nós, destacou a importância de iniciativas que buscam preservar as raízes culturais do Maranhão: “Nosso objetivo com este projeto é reconhecer o valor dos mestres e mestras, que dedicam suas vidas à preservação e difusão das nossas tradições populares. Eles são os protetores do nosso patrimônio imaterial, que é indispensável para preservar nossa identidade cultural.”
A coordenadora cultural do Boi da Floresta, Talyene Cruz, é defensora das manifestações culturais maranhenses e ressalta a relevância de políticas públicas voltadas para a cultura. “Projetos como este são fundamentais para fortalecer a autoestima do povo maranhense e para garantir que nossas tradições sejam transmitidas às futuras gerações. Valorizar o que é produzido culturalmente no Maranhão é essencial para construirmos uma sociedade mais justa e consciente de suas raízes”, avalia.
O projeto faz uma provocação para que o poder público reconheça e promova a importância desses mestres, proporcionando o apoio necessário para desempenharem seu papel vital na comunidade. “Infelizmente, a falta de valorização por parte do poder público pode resultar em diversos riscos”, critica Jhonatan Soares. Ele pontua que a ausência de reconhecimento pode levar à marginalização desses mestres, levando muitos deles a abandonar suas práticas tradicionais devido à falta de incentivo e suporte financeiro.
Soares aponta como consequência a perda de saberes valiosos, mas também a descaracterização da rica herança cultural maranhense. “Além disso, a falta de valorização pode comprometer a transmissão intergeracional desses conhecimentos. Se os mestres não forem reconhecidos como agentes culturais importantes, a próxima geração pode não sentir a mesma motivação para aprender e preservar as tradições, resultando na perda gradual desses elementos distintivos da cultura popular maranhense”, observa.
É considerado mestre da cultura popular, a pessoa física detentora de saberes e que tenha notório conhecimento, longa permanência na atividade e que seja reconhecida por sua própria comunidade, como referência na transmissão de saberes, celebrações ou formas de expressões da tradição popular maranhense. Neste sentido, o Programa de Valorização de Mestres e Mestras dos Saberes da Cultura Popular Maranhense reconhece o trabalho desses mestres e contribui para estimular a criação de políticas públicas efetivas, que assegurem a continuidade e a perpetuação das manifestações culturais maranhenses.
“Portanto, a valorização dos mestres e mestras da cultura popular maranhense não é apenas uma questão cultural, é também econômica e social. O turismo cultural, por exemplo, pode se beneficiar significativamente da preservação e promoção dessas práticas, atraindo visitantes interessados na autenticidade e riqueza cultural de região”, frisou Soares.
Proteção e valorização
A proposta reflete o reconhecimento dos fazedores culturais das principais manifestações, que referenciam o Maranhão para o país e o mundo. Marcado pelas cores, danças e ritmos, o bumba-meu-boi é a expressão máxima da cultura popular do Maranhão. Elevado a Patrimônio Imaterial do povo brasileiro, a manifestação tem origens indefinidas, mas elementos culturais africanos e europeus, introduzidos principalmente por meio da religiosidade.
No Maranhão, a variedade de sotaques faz a diferença. O Sotaque de Zabumba é ritmo original que marca a forte influência africana na manifestação. São utilizados instrumentos como pandeirinhos, maracás e tantãs, além das zabumbas. O Sotaque de Orquestra incorpora outras influências com o acompanhamento de instrumentos de sopro e cordas. O vestuário é bem elaborado e diferenciado dos demais ritmos. Dentre os mais conhecidos, estão Boi de Morros, Boi de Axixá, Boi de Sonhos e Boi de Nina Rodrigues.
O Sotaque de Pindaré é marcado pelas matracas e pandeiros pequenos dão o ritmo deste sotaque. E o personagem Cazumbá, uma mistura de homem e bicho é o destaque que diverte os brincantes e o público. Destacam-se Boi da Baixada, Boi de Apolônio, Boi de Pindaré, Boi Unidos de Santa Fé. No Sotaque de Costa de Mão, que é típico da região de Cururupu – Floresta dos Guarás – recebe este nome em virtude de uns pequenos pandeiros tocados com as costas das mãos. Além de roupa em veludo bordado, os brincantes usam chapéus em forma de cogumelo, com fitas coloridas e grinaldas de flores. O Boi de Cururupu é o mais tradicional.
O Sotaque da Ilha ou de Matraca é conhecido como originário da Ilha de São Luís e que utiliza como principais instrumentos as matracas e os chamados pandeirões. São os mais populares e queridos, formando verdadeiras nações, a exemplo dos bois de Maracanã, Maioba e Madre Deus. Em todo o estado, são mais de quatrocentos grupos de Bumba-Meu-Boi encantando quem assiste a essa bela demonstração popular.
No conjunto de danças populares, o Tambor de Crioula é uma manifestação de raízes africanas e só existe no Maranhão. Em 2011, foi reconhecido como Patrimônio Imaterial Brasileiro. Os tocadores e coureiras, como são chamadas as dançarinas do Tambor, ganham as ruas espalhando animação e muito ritmo.
E o Cacuriá, conhecido pela coreografia sensual e músicas de duplo sentido, é uma dança que já se enraizou na cultura popular do Maranhão. A dança foi criada em 1973, na capital, por Alauriano Campos de Almeida, folclorista conhecido como “Seu Lauro”. Atualmente, tem no grupo Balaio de Rosas (antigo Cacuriá de Dona Teté), um de seus maiores representantes.
Além do Tambor de Crioula, diversas outras danças típicas como as quadrilhas, a Dança do Caroço, a Dança do Lelê, a Dança do Coco, São Gonçalo, Dança Portuguesa entre outras, fazem da cultura imaterial maranhense um vibrante caleidoscópio artístico e folclórico vivo e autêntico.
Norma
O Projeto de Lei do Coletivo Nós corrobora com a Lei Orgânica de São Luís. A norma aponta que o município deve assegurar o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes de cultura e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais. A lei também aponta a necessidade da criação de diretrizes legais de proteção, apoio, reconhecimento e difusão dos conhecimentos e expressões culturais.
A proposta também colabora com a implementação da Lei nacional nº 11.645/08, que estabelece a obrigatoriedade do ensino da história e cultura indígena no ensino básico, colaborando ainda com o Estatuto da Igualdade Racial e com o combate ao racismo.
Critérios
Os conteúdos referentes às manifestações culturais terão como prioridade as reconhecidas enquanto patrimônio, como a capoeira, grupos de bumba meu boi, tambor de crioula, além de outras manifestações, que contenham elementos que valorizem a cultura afro-brasileira e indígena. Entre os objetivos da proposta está, preservar e valorizar o patrimônio cultural material e imaterial maranhenses no município; proteger e promover a diversidade das expressões culturais; promover o reconhecimento dos saberes e fazeres tradicionais de mestres e mestras da cultura popular enquanto patrimônio cultural; propiciar a estudantes de escolas públicas, além do público em geral, a vivência de atividades que marcam a cultura maranhense.
O projeto de lei propõe ainda, ser um elo entre a educação e cultura em um mesmo ambiente, para uma troca rica de sabedoria entre mestres, artesãos, fazedores de cultura e alunos da rede pública; disseminar as tradições culturais do estado e a sabedoria popular, conseguindo abordar todas essas tradições do estado em suas especificidades de cada região; valorizar a identidade cultural maranhense. Ainda segundo a proposta, serão estimuladas ações de extensão voltadas ao diálogo, interação e envolvimento com os grupos que preservam as manifestações culturais.
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